æ ensaios
Rodoviárias de Londrina e Jaú: 4 momentos
Projeto/Funcionamento/Obsolescência/Reabilitação
Profa.
Dra. Maria Augusta Justi Pisani e Prof. Dr. Paulo Roberto Corrêa
RESUMO
Este
Estas
Os
A
PALAVRAS-CHAVE: Terminal
This article approaches two referential
works of the Brazilian Architecture, projected by
These emblematic works were selected due
to the similarity and differences among each other, and because they represent
distinct projetual moments of the professional life of this important
architect. Both are properties tumbled by the respective preservation body of
historical-architectural patrimony of each state, because they got provocative
plastic and constructive speculations at the time they were projected, what
confers to these works the exceptional character, concerning the architectural
typology. Other factors that qualifies this selection are the particularities
of these architectural object and because both have had a very antagonistic
destinies: Londrina bus station that was reinstate for one another usage
different of the original one in spite of the outstanding characteristis of the
spaces generated starting from the programs of needs that bus stations request.
And Jau bus station that passed by a long deterioration process and almost
didn’t have its original use substituted also however this destiny was reverted
because of the architectural and town planning conception of its spaces that
were adapted with easiness to the contemporary functional demands staying
complete and in complete operation.
KEY WORDS:
Bus Station; Vilanova Artigas; Building
reinstatement.
1.
LONDRINA
O norte do Estado do Paraná, até meados da
década de 20 do século passado, era uma região repleta de flrorestas e com
poucos colonizadores fixos. Em 1924, com a chegada da missão inglesa liderada
pelo Lord Montagu e contando com o técnico
Os ingleses vieram para realizar investimentos
de grande porte na agricultura interessados, inicialmente, na possibilidade do
plantio de algodão tendo em vista a fertilidade do solo
roxo e a oferta de grandes extensões de terras. Dessa forma, em
25 de dezembro de 1925, estes constituíram a Companhia de Terras Norte do
Paraná que adquiriu, do Governo do Estado, uma gleba com 500 mil alqueires para
o plantio de algodão. A partir de 1928, o objetivo inicial das lavouras de
algodão foi deixado de lado e se iniciou a colonização da margem esquerda do
Rio Paranapanema, entre os Rios Ivaí e Tibagi.
Inicia-se a constituição de Londrina por meio do
Patrimônio Três Bocas, um empreendimento projetado pela iniciativa privada, em
21 de agosto de 1929. Chegam, então, os primeiros colonos vindos do Japão,
unindo-se à colônia alemã, que já se encontrava na referida área, no final
desse mesmo ano. A fundação da cidade acontece em 1931 e a criação do município
se dá pelo Decreto Estadual de 3 de dezembro de 1934, atribuindo-se, ao mesmo,
o nome em homenagem aos ingleses que investiam na região.
O crescimento econômico é acelerado, decorrência
direta da alta produtividade do solo e pela produção cafeeira. Esse “boom” de
desenvolvimento faz com que, entre o período de
Foto 1 – Vista aérea da Cidade de Londrina
Fonte: Museu da Biopar – Medicina Laboratorial.
In: http://www.biopar.com.br/museu.htm acesso em 20/06/2007.
Em fins da década de 40, no auge da produção
cafeeira, a Arquitetura Moderna é adotada como um símbolo de enriquecimento e
modernização da jovem cidade de Londrina. Dentro deste contexto, na gestão
municipal de Hugo Cabral, o Arquiteto Vilanova Artigas é convidado para
projetar a estação rodoviária da cidade, projeto este que traz inovações
formais e estéticas, acompanhadas por especulações tecnológicas criativas, o
que acaba por conferir à obra características sem similares à produção edilícia
da época. A foto 1 mostra uma vista aérea de Londrina na década de 40 onde
nota-se que a cidade era um grande “canteiro de obras” devido as novas
necessidades construtivas geradas pela alta produção cafeeira.
1.1
Projeto e construção
A rodoviária é um marco arquitetônico, desde sua
inauguração, modernizando o centro da cidade e tornando-se referência, tanto
internamente, quanto externamente, ao Estado do Paraná. A proposta arquitetônica
é caracterizada pela presença marcante de um conjunto de sete cascas de
concreto armado em forma de abóbada, sendo que a última seção é apoiada em
pilares inclinados, com pé direito duplo, oferecendo espaços públicos generosos
e integrados à praça no nível inferior e à malha viária que circunda o terreno.
(fotos 2 e 3)
Foto 2. Rodoviária de Londrina na década de 50 e
Foto 3 - Vilanova Artigas na década de 70. Fonte: Castelnou (2002)
Fato interessante e
esclarecedor, aos historiadores e pesquisadores da Arquitetura Moderna no
Brasil e especificamente aos estudiosos da obra de Vilanova Artigas é gerado
pela obra desta rodoviária, que teve seu início em 1949. Obra esta contratada
pelo então Secretário de Obras e Viação do Município de Londrina na gestão do
Prefeito Hugo Cabral, o Engenheiro Civil formado pelo Mackenzie Rubens
Cascaldi, irmão de Carlos Cascaldi, que nesta época era aluno de Artigas na
Escola Politécnica da Universidade de São Paulo e que se tornaria,
posteriormente, sócio de Vilanova Artigas.
A rodoviária foi inaugurada em 1952, ano em que o arquiteto Carlos Cascaldi começa a trabalhar com Vilanova Artigas. Este adendo é importante porque, segundo Júlio Camargo Artigas (2007), grande parte da historiografia brasileira especializada veicula informação equivocada quando considera Cascaldi como co-autor do projeto da rodoviária de Londrina.
O projeto arquitetônico fica pronto em 1949,
mesmo ano em que começa a construção, cujo acompanhamento foi realizado por
Rubens Cascaldi, na qualidade de engenheiro da Prefeitura Municipal de
Londrina. A proposta da estrutura formulada por Vilanova Artigas e calculada
pelo Engenheiro Augusto Carlos de Vasconcelos, materializa-se por meio de um
conjunto de cascas de concreto com
Foto 4 – Cobertura em casca na forma de abóbada.
Fonte: Pisani, Maria
O projeto se desenvolve longitudinalmente ao
eixo leste-oeste, constituído por um bloco de forma trapezoidal de quatro
pavimentos em planta livre, que são interligados por escadas e rampas (vide
figura 1), que abriga as funções administrativas e de serviços de apoio aos
passageiros em trânsito.
Na fachada sul, já que a incidência de sol é
bastante diminuta, foi proposto como fechamento, uma caixilharia de ferro e de
grandes panos de vidros transparentes, dialogando, harmoniosamente, com o
desenho esbelto e leve da marquise em concreto armado, que se apóia na estrutura
do bloco administrativo e em duas estruturas tubulares em forma de “V” (foto
5). Esta marquise busca o usuário na rua, no nível superior do bloco, pois o
terreno apresenta um desnível de aproximadamente quatro metros em relação a
plataforma de embarque e desembarque de passageiros. A ligação entre o nível
mais alto e as plataformas se dá através de rampas, que é outra característica
marcante da produção arquitetônica de Artigas.
Figura 1 – Corte e planta da Rodoviária de
Londrina. Fonte: redesenhado a partir de ARTIGAS, Júlio Camargo (2006).
Foto 5 – Entrada pela fachada sul. Fonte:
PISANI, Maria
Sustentada por este bloco, desenvolve-se a
seqüência das sete abóbadas cilíndricas que irão proteger os passageiros do sol
e da chuva no momento do embarque e do desembarque, como também, as sete baias
para os ônibus, posicionadas de forma oblíqua à plataforma. Na fachada norte,
Artigas adota a solução de uma “cortina” de “brise soleil”, solução esta não
usual para a época e que, posteriormente, irá se constituir em importante
elemento caracterizador da Arquitetura Moderna brasileira.
As fotos 6 e 7 revelam as rampas de ligação da parte interna do bloco de serviços e administração e a ligação visual com a parte alta e a parte baixa da cidade. Durante o percurso nas rampas o usuário pode usufruir de vista panorâmica da cidade e dos espaços internos e externos da rodoviária. Esta também é uma das características presentes em vários projetos de Artigas.
Fotos 6 e 7 – vistas internas do bloco de apoio.
Fonte: PISANI, Maria
A solução estrutural em casca de concreto tem
como apoio intermediário entre as calotas, vigas em forma de “v” que cumprem
duas funções simultaneamente. A primeira, de funcionar como calha para captação
das águas pluviais e a segunda, quando ficam em balanço após os apoios dos
pilares, cumprem a função de provocar uma tensão inversa sobre a casca, solução
criativa que permite que as cascas atinjam espessura média de
A Praça Rocha Pombo dá a
continuidade ao terminal, unindo-se a este por meio de escadas e fazendo a
integração com a parte baixa da cidade, criando eixos de passagem com bela
integração paisagística. Segundo Castelnou (2002) a implantação do terminal na
Praça Rocha Pombo foi essencial para que se criasse uma generosa área cívica,
local que se tornaria palco dos grandes comícios na década de 50 e de intensa
movimentação e encontro da população londrinense. Novo projeto paisagístico da praça foi
executado em 1954, compondo-a de forma ajeitada aos espaços públicos da
rodoviária.
Deve-se ressaltar um equívoco cometido junto a
estrutura belíssima proposta por Artigas quando, nos anos 70, um engenheiro da
Prefeitura Municipal de Londrina, sem consultar o autor do projeto, coloca um
“reforço” de concreto totalmente desnecessário, posicionado em diagonal a
estrutura original no último módulo da casca (foto 8).
A alegação para tal interferência indesejada
era de que a obra poderia ruir. Artigas, na época, manifestou-se contra, mas
não foi ouvido. Infelizmente esta agressão ainda permanece na obra, mesmo
depois do restauro.
Foto 8 – Reforço em diagonal colocado na
estrutura a posteriori. Fonte:
PISANI, Maria
Nos primeiros anos de funcionamento, a
Rodoviária de Londrina já enfrenta o movimento intenso do transporte
intermunicipal devido ao acelerado crescimento econômico da cidade e região.
Nos anos 70, com o ápice deste desenvolvimento, a infra-estrutura do terminal
mostra-se incapaz de continuar absorvendo este movimento intermunicipal,
propiciado pelo constante aumento de demanda do transporte rodoviário. Como se
esses fatores, por si só, não fossem suficientes para levar a rodoviária a uma
condição de obsolescência, a situação é ainda agravada pelo crescimento e
adensamento da cidade no seu entorno, tornando tal condição, irreversível.
1.2
– Tombamento e restauro com mudança de uso
Frente a essa condição de irreversibilidade e
para atender as novas demandas geradas pelo crescimento do movimento
intermunicipal de passageiros, não resta outra opção ao gestor municipal senão
a escolha de outro local para a construção de um novo terminal rodoviário,
decisão essa denotada de três fatores: primeiro, a obra de Artigas já nasceu como
um patrimônio arquitetônico e dificilmente as obras de ampliação não iriam
prejudicá-la (é o primeiro edifício público Moderno no Estado do Paraná);
segundo, o centro do núcleo urbano não dispunha de área disponível para a
ampliação; e, terceiro, para evitar o impacto negativo que o fluxo intenso de
ônibus traria para o centro comercial e cultural da cidade, que se adensou de
forma constante após a edificação da antiga rodoviária.
Tais condicionantes fazem com que a Secretaria
da Cultura do Estado do Paraná promova, no ano de 1975, o processo de
tombamento da Rodoviária de Londrina, usando de argumentos decorrentes da
expressão e das características dos novos conceitos de Arquitetura e
construção, presentes no edifício. Fez parte do tombamento do edifício da
rodoviária, a Praça Rocha Pombo, onde a mesma está paisagisticamente integrada.
A partir desta data, a Estação Rodoviária de Londrina passa a se chamar “
Após a saída do terminal rodoviário, o edifício
foi utilizado inicialmente para feiras de artes e artesanato, sem os devidos
cuidados com a manutenção predial, o que gerou uma grande deterioração.
Após alguns anos de impasse a obra de Vilanova
Artigas foi restaurada em 1993, com projeto dos Arquitetos Antonio Carlos Zani
e Jorge Marão C. Miguel que adaptaram o edifício para o Museu de Arte de
Londrina, uso que se mantém até o momento. Foram acrescentados aparelhos de ar
condicionados abaixo dos brises (foto 9), mas os apoios acrescentados a
posteriori, e indesejados por Artigas, ainda permanecem no edifício. Essas duas
decisões do projeto de restauro interferem na linguagem arquitetônica original.
Foto 9 – Fachada norte com os brises. Fonte: PISANI,
Maria Augusta Justi (2006).
Após levantamento de campo (dezembro de 2006)
constatou-se que o edifício está bem preservado no seu interior, porém, a
fachada norte, que recebe os “brises”, está bastante deteriorada, necessitando
de novo restauro. O edifício foi totalmente cercado por telas e grades com mais
de
Foto 10 – vista da cobertura no sentido oeste-
leste, com a vista do gradil a esquerda que separa a Praça Rocha Pombo. Fonte:
PISANI, Maria
As obras então realizadas
por Artigas na cidade de Londrina, como o Fórum, o Cine Ouro e o Edifício
Autolon, estas em parceria com o Arquiteto Carlos Cascaldi, juntamente com a
Rodoviária de Londrina, tornam-se uma referência que veio a influenciar o fazer
arquitetônico Londrinense.
2.
JAÚ
A cidade de Jaú, localizada na região
central do estado de São Paulo, é servida pelas rodovias SP225, que liga
Brotas, Itirapina, Bauru e Marília; SP255, que liga Bocaina, Araraquara, Barra
Bonita e São Manuel; e, SP304, que liga Bariri e Santa Maria da Serra,
propiciando, desta forma, uma conecção ágil e rápida com o sistema rodoviário
estruturador do estado de São Paulo, constituído pelas rodovias Washington
Luiz, Bandeirantes, Anhanguera, Marechal Rondon e Castelo Branco.
Complementando este sistema de circulação de grande escala, o município é
também beneficiado pela Hidrovia Tietê-Paraná e pela presença do terminal de
transporte intermodal hidro-ferro-rodoviário. Esta cidade constitui-se, atualmente,
em um pólo industrial expressivo na região sudeste do estado, pelo fato de ter,
como principais atividades econômicas, a indústria calçadista e a agroindústria
canavieira, ocupando esta atividade posição de destaque, já que alça a região
entre as grandes produtoras de açúcar e álcool do estado de São Paulo.
2.1
Sobre o objeto
Ao analisarmos o objeto arquitetônico
propriamente dito optamos, inicialmente, pela criação de uma metáfora, que
associa o movimento de fluxos da rodoviária aos movimentos de sístole e
diástole de um coração humano, já que, tanto um, quanto o outro, necessitam
estar articulados a um sistema de circulação para que possam vir a cumprir os
seus objetivos. Portanto, para nós, os vários níveis do sistema rodoviário,
apresentados anteriormente, são como as artérias de um corpo humano; o sistema
viário urbano cumpre o papel de seu sistema de veias que, juntos, cumprem a
função de fazer circular, num caso o sangue, no outro, as pessoas e seus meios
de transporte.
Foto
11 – O corpo humano translúcido. Fonte: desconhecida. Figura 2 e 3 – Mapas
extraídos do Plano Diretor Municipal da Cidade de Jaú, Fonte:
www.jau.sp.gov.br,
acessado em 22/03/07.
A rodoviária de Jaú sofreu, como a maioria dos
edifícios públicos neste país, de total ausência de manutenção e conservação,
chegando a configurar, em seus espaços, o retrato do desmazelo e da degradação,
tanto física como de usos. Tal condição, da mesma forma que um coração doente,
quase leva a óbito o “paciente”. No caso deste objeto de estudo, fizeram-se
levantar vozes de amplos setores da Arquitetura brasileira, com o objetivo de
se ver reparado, mediante um tratamento adequado, a dignidade deste importante
marco arquitetônico, que se encontra em processo de tombamento pelo Conselho de
Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado
de São Paulo.
De forma sintética, os espaços desta
rodoviária se desenvolvem a partir da localização das atividades funcionais, em
três níveis distintos e sob uma única cobertura de aproximadamente
Figura 4 – Croqui da planta da rodoviária de Jaú.
Fonte: Artigas, Júlio Camargo (2006). Foto 12 – Detalhe da Coluna. Fonte:
Corrêa, Paulo (2007). Foto 13 – Lírio. Fonte: www.akvis.com,
acessado em 23/03/07.
Porém, uma outra qualidade, não tão
fácil de ser visualizada e muito mais sutil, se encerra neste marco da
Arquitetura brasileira, que é o da incorporação das questões do urbano em seus
espaços físicos. Tal leitura se inicia na própria solução estrutural, que
possibilita balanços da ordem de
Foto 14 –
Varanda superior. Foto 15 – Interior.
Fonte: Corrêa, Paulo (2007).
Outro ponto de destaque do partido
arquitetônico desta obra são os acessos laterais, que se dão por meio de rampas
e que se abrem para duas praças laterais. Essas praças exercem a função de
intermediar o diálogo entre a cidade e a rodoviária, criando o espaço de estar
em que o anfitrião recepciona o visitante. Internamente ao edifício, este
espaço se desenha com um pé direito baixo, produzindo no usuário uma sensação
de surpresa, pois, ao vencer este pequeno ambiente, o mesmo se depara com a
visualização total dos espaços internos compreendidos pelas rampas que conectam
os três níveis de piso, pela plataforma de embarque e desembarque de
passageiros, e pela área comercial e bilheterias.
Foto 16 – Vista da praça para o acesso. Foto 17 –
Vista do acesso lateral para a praça.Foto 18 – Pavimentos internos. Fonte:
Corrêa, Paulo (2007).
A implantação deste retângulo de 55,00 x
Figura 5– Mapa extraídos do Plano Diretor Municipal
da Cidade de Jaú, Fonte:
www.jau.sp.gov.br, acessado em
22/03/07, com intervenção de Corrêa, Paulo (2007). Figura 6 – Croqui, corte transversal. Fonte: Artigas.
Júlio Camargo. (2006)
Com a mesma preocupação de buscar um
diálogo entre o edifício e a cidade, Artigas irá propor, para os espaços
destinados às áreas comerciais, esta condição de ver (internamente) e de ser
vista (externamente). Isto significa que este ambiente, destinado a breves
permanências e de apoio aos passageiros em trânsito ou ao simples usuário,
possibilita ao freqüentador que desfrute visualmente da cidade (ver) e, por
outro lado, este mesmo ambiente se apresenta à cidade como um retângulo
longilíneo envidraçado que, ao mesmo tempo em que dá a sensação de estar
flutuando sobre o local de embarque e desembarque de passageiros, cumpre a
função de proteger os mesmos (de ser vista).
Foto 19 – Interior da rodoviária com vista para a
“cidade baixa”. Foto 20 – Interior área das lanchonetes. Foto 21 – Rodoviária
de Jaú, Rua Humaitá. Fonte: Corrêa, Paulo (2007).
Como se estas análises realizadas nos
parágrafos anteriores não fossem, por si só, suficientes para confirmar as
qualidades urbanísticas deste artefato arquitetônico, o mesmo alcançará o ápice
desta condição ao receber em seus espaços contíguos e de forma bastante
coerente, mesmo não fazendo parte do projeto original, a adição do Terminal
Integrado de Transporte Coletivo, explicitadas pelo novo uso de sua “varanda
urbana”, voltada para a Rua Saldanha Marinho (“cidade alta”), de atender às
funções de embarque e desembarque de passageiros do referido terminal,
decorrência direta da generosidade urbana com que os espaços da rodoviária
foram trabalhados/desenhados pelo arquiteto Vilanova Artigas.
Foto 22 – Vista do Terminal de Integração de
Transporte Coletivo. Foto 23 – Vista da plataforma de embarque e desembarque do
Terminal de Integração de Transporte coletivo, sob a “varanda urbana” voltada
para a Rua Saldanha Marinho (cidade alta). Fonte: Corrêa, Paulo (2007).
Após realizar o projeto de restauro deste edifício, o arquiteto Júlio Artigas, filho de Vilanova Artigas, depara-se com um grande desafio profissional e ético, que é o de se responsabilizar pela autoria do projeto arquitetônico do citado terminal de integração, desafio este que é denotado da própria condição de edifício em vias de ser tombado pelos órgãos de preservação do patrimônio artístico, cultural e arquitetônico, tanto municipal, quanto estadual; tratando-se, portanto, de obra elevada à categoria de paradigma desta temática projetiva. (figura 6 e 7)
Figura 6. Implantação do
conjunto. Fonte: Artigas, Júlio.
Figura 7. Planta de
cobertura do conjunto. Fonte: Artigas, Júlio.
Júlio Artigas, em atitude de reverência
à obra e de respeito ao pai, irá propor uma solução singela para o seu projeto
de terminal, porém, não deixando de imprimir à mesma, de forma bastante sutil,
elementos de significado profundamente referenciados com a produção
arquitetural do pai, elementos estes identificados como, por exemplo, pela cor
azul utilizada, não um tom de azul qualquer, mas aquele tom de azul com
pigmentação preta criado por Artigas, tendo sido classificado, posteriormente,
como “azul Artigas”. A menção feita aos 4 pontos de apoio estruturais,
tipologia estrutural criada por Artigas e assumida por inúmeros arquitetos
contemporâneos a Vilanova, e as 4 aberturas zenitais, que complementam a
intersecção entre pilar e viga, uma analogia, talvez inconsciente por parte do
autor, com as zenitais também presentes no desenho peculiar das colunas da
rodoviária.
Foto 24 – Detalhe das
zenitais do Terminal de Integração. Fonte: Corrêa, Paulo (2007).
Outros pontos relevantes, que demonstram
esta sutileza da postura projetual do profissional perante a obra consagrada,
são verificados pela decisão de sobrepor a cobertura do terminal à cobertura da
rodoviária, de maneira a resultar, entre uma e outra, apenas uma fresta de luz,
ficando assegurada a possibilidade de apreensão visual entre a “cidade alta” e
a “cidade baixa”, a partir do patamar da rampa, como já mencionado
anteriormente. Esta sobreposição é que irá permitir ao passageiro adentrar, de
forma a estar protegido do sol e da chuva, no transporte coletivo. (Figura 8)
Figura 8. Corte
Longitudinal e Elevação. Fonte: Artigas, Júlio.
Foto 25 – Detalhe da sobreposição da cobertura do
Terminal de Integração com a cobertura da Rodoviária de Jaú. Fonte: Corrêa,
Paulo (2007).
Finalmente, a decisão projetual de
manter desalinhados os eixos dos pilares do terminal com as colunas da
rodoviária, com o intuito de evidenciar, de fato, o contraste entre a obra
paradigmática e a obra nova.
3
– CONSIDERAÇÕES FINAIS
As duas Rodoviárias, de Londrina e de
Jaú, ambas projetadas por Artigas, denotam o total domínio do processo
projetual, resultando em arquiteturas arrojadas, com todas as características
necessárias para o atendimento das funções propostas pelo gestor municipal e
indo além destas, gerando novos espaços públicos de passagem e convívio.
No cado de Londrina, a
integração entre os objeto arquitetônico, a praça e a cidade foi interrompida
por meio da colocação de barreiras físicas a posterior, impedindo que a
população possa usufruir desses espaços. A cobertura criativa da antiga
plataforma apresenta-se solitária e expectadora do vai e vem intenso das
calçadas atrás dos gradis que a separa, provavelmente lembrando-se de um passado
não tão remoto, cujas sombras se ofereciam de maneira farta e generosa aos
usuários que por ali transitavam.
Seus espaços tornaram-se
obsoletos, em função da falta de previsão, por parte dos gestores municipais, do
crescimento econômico e espacial que a cidade enfrentaria na década seguinte,
posterior à sua inauguração. No entanto, como referencial da Arquitetura de um
determinado momento econômico, social e técnico, o edifício foi devidamente
tombado e preservado para as gerações futuras. A proposta de reabilitação e
restauro do edifício deixa margem a dois questionamentos: o primeiro, sobre a
necessidade dos aparelhos de ar condicionado na fachada com “brises” e, o
segundo, sobre a adição do reforço estrutural que macula a proposta estrutural
original.
Embora já se tenham passado
mais de 30 anos desde sua inauguração, a rodoviária de Jaú permanece integrada
aos elementos urbanísticos do seu entorno, condicionante esta que se acentua,
de maneira ainda mais velada, quando seus espaços se oferecem para cumprir mais
uma função adicional e contemporânea, que é a de abrigar as instalações do
Terminal Integrado de Transporte Coletivo.
Estas obras primas assumem
as posições de marcos referenciais da Arquitetura Moderna Brasileira, por
conterem em suas soluções arquitetônicas, de forma simultânea e complementar,
arrojo e singularidade, tanto nos aspectos estéticos, formais e nas técnicas
construtivas empregadas, como no “diálogo” que produz com a cidade, decorrência
direta das questões urbanísticas e das relações sociais inseridas na própria
obra.
4 - Referências Bibliográficas
ARTIGAS, Júlio Camargo. Entrevista dada a Maria
ARTIGAS, Júlio Camargo. Acervo Pessoal, 2006
CASTELNOU, Antonio. Arquitetura Londrinense.
Expressões de Intenção Pioneira, 1ª ed. Londrina, Atrito Art, 2002
CORRÊA, Paulo Roberto. Acervo Pessoal, 2007
Instituto Lina Bo e P. M. Bardi e Fundação
Vilanova Artigas. Vilanova Artigas – Arquitetos Brasileiros / Brazilian
Architects. São Paulo: Instituto Lina Bo e P. M. Bardi e Fundação Vilanova
Artigas, 1997.
PISANI, Maria Augusta Justi. Acervo Pessoal,
2006
Plano Diretor do Município de Jaú, in:
www.jau.sp.gov.br,
acessado em 22/03/07.
Secretaria da Cultura do Estado do Paraná. Livro
Tombo Histórico. Antiga Estação Rodoviária. Inscrição do Tomo 52-II, processo
número 53/74, 08/12/1974, Londrina, 1974. in:
http://www.patrimoniocultural.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=128
, acessado em 09/03/2007.
VASCONCELOS, Augusto Carlos e CARRIERI Jr, Renato.
A escola brasileira do concreto armado. São Paulo: Axis Mundi, 2006.